“Mostre-me tudo isso na Sagrada Escritura, e eu acreditarei em você”, poderá dizer-nos algum amigo não-católico. “Não creio em nada que não esteja escrito na Bíblia”, dir-nos-á outro. “Nenhuma igreja vai dizer-me em que devo acreditar, só a Bíblia me basta”, afirmará ainda um terceiro. E não é raro que tenhamos que ouvir, dirigidas contra nós, acusações como esta: “Os católicos não lêem a Bíblia. São obrigados a acreditar em tudo que lhes contam os padres”.
Quando nos vemos diante de afirmação deste tipo, e se a pessoa que as faz relmente deseja conhecer a verdade, e não simplesmente discutir pelo gosto de auto-afirmar-se, há alguns pontos que poderemos esclarecer-lhe. Provavelmente, ainda não lhe ocorreu enfrentar-se com algumas perguntas elementares.
Em primeiro lugar, poderemos perguntar-lhe como é que ele sabe que Bíblia é a Palavra de Deus. Não há nenhuma passagem na própria Sagrada Escritura que o afirme explicitamente. Desde sempre, a única garantia que possuímos de que a Bíblia é um livro inspirado por Deus é… a palavra da Igreja Católica.
Quem não crê na Igreja Católica não tem a menor razão para crer nas Escrituras.
Foi a Igreja Católica que reuniu pacientemente, durante o primeiro século depois da vinda de Cristo, os escritos autênticos dos Apóstolos e discípulos do Senhor. Foi a Igreja Católica que os separou cuidadosamente dos textos “apócrifos”, isto é, das epístolas e evangelhos falsamente atribuídos por pessoas bem intencionadas e dotadas de grande capacidade imaginativa, mas desprovidas da assistência divina.
Foi a Igreja Católica que catalogou a pôs em ordem os livros que constituem o Novo Testamento, e os acrescentou aos livros inspirados do Antigo Testamento, redigidos pelos antigos patriarcas, profetas e historiadores do povo judeu. Por fim, foi a Igreja Católica que, depois de ter feito tudo isso, declarou solenemente: “Estas e somente estas são as Sagradas Escrituras; esta é a Palavra de Deus”.
Ora bem, a primeira igreja protestante nasceu mil e quinhentos anos depois de Cristo. Quando Lutero proclamou que a Escritura era a única fonte da verdade cristã, estava na verdade incorrendo numa contradição: por um lado, pretendia negar a Tradição católica; por outro, tinha de aceitar essa mesma Tradição, por ser ela a única fonte que lhe assegurava ser a Bíblia a Palavra de Deus.
Em segundo lugar, poderemos perguntar ao nosso amigo protestante: se Cristo desejava que nos guiássemos por um livro, e somente por esse livro, por que razão recomendou tantas vezes aos seus Apóstolos: Ide e pregai, ou Ide e ensinai? Por que não lhes disse: “Ide e Escrevei”?
Com efeito, se é somente na Bíblia que encontramos a Palavra de Deus, que dizer dos primeiros cristãos? Será que não eram cristãos? Porque, na verdade, os Evangelhos e Epístolas somente começaram a ser escritos vários anos depois da Ascensão do Senhor aos Céus. E que dizer dos cristãos que viveram durante os mil e quatrocentos anos anteriores à invenção da imprensa, em que as Bíblias eram muito raras e tinham de ser copiadas à mão? Como podiam essas salvar a sua alma sem dispor de Bíblias para ler? E que dizer de todos esses nossos contemporâneos que não sabem ler? Será que o Céu lhes está fechado porque a Bíblia é para ser um livro fechado?
Portanto, os católicos crêem na Sagrada Escritura e em cada palavra contida nela – crêem que é um livro inspirado por Deus -, mas crêem também na Palavra Viva, na voz igualmente inspirada da Igreja que Cristo fundou, e que tem a responsabilidade de interpretar a Bíblia em nome do Senhor.
Aliás, a própria Escritura nos previne acerca da facilidade com que incorrem em erro os que tentam interpretá-la guiados unicamente pelo espírito próprio. Na sua segunda Epístola, São Pedro, referindo-se às Cartas de São Paulo, afirma:Há nelas algumas coisas difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes adulteram (como também as outras Escrituras) para a sua própria perdição (2 Pe 3,16). Com perdão da repetição: é a própria Bíblia que o diz!
Os católicos crêem na Bíblia, mas crêem também em outras coisas: crêem em tudo o que Cristo ensinou, em tudo o que os Apóstolos pregaram, mesmo que não tenha sido posto por escrito na Sagrada Escritura. Se reuníssemos todas as palavras do Senhor registradas pelos Evangelistas, e todas as suas frases recolhidas nas Epístolas – bem, talvez o Senhor não levasse mais de dois dias para pronunciá-las todas. Será que isso é tudo o que disse durante os seus três anos de ensino e pregação? Ou será que passou todo este tempo a repeti-las constantemente? Deixemos que seja o Apóstolo São João quem nos dê a resposta, com as palavras que põe no final do seu Evangelho: Muitas outras coisas há que Jesus fez, as quais, se se escrevessem uma por uma, creio que nem no mundo todo poderiam caber os livros que seria preciso escrever (Jo 21,25).
Os Católicos crêem, por isso, que há dois canais através dos quais nos chega a Verdade divina: a Sagrada Escritura, tal como é interpretada pelo representante vivo de Cristo, que é a Igreja, e a Tradição. A Tradição consiste simplesmente naquele conjunto de verdades que foram ensinadas por Cristo e pregadas pelos Apóstolos, mas não foram recolhidas nos Evangelhos nem nas Epístolas. Essas verdades vêm sendo transmitidas de geração em geração pela Igreja, que as guarda cuidadosamente como um tesouro. Aliás, a sua principal responsabilidade, diante de Deus, consiste precisamente em custodiar e transmitir-nos (quer saibamos ler, quer não) o conjunto total das Verdades reveladas por Cristo.
A Igreja nunca nos manda crer em determinada afirmação – isto é, nunca “define um dogma”- sem ter a mais absoluta certeza de que a verdade que nos propõe foi defendida e ensinada pelos próprios Apóstolos, ou pelo menos deriva diretamente dos seus ensinamentos. A Igreja Católica não pode nem nunca poderá ensinar uma doutrina nova. Com a morte do último Apóstolo (São João), deixou de haver novos ensinamentos: nesse instante, Deus acabou de dizer tudo o que tinha a dizer-nos, a sua Revelação à humanidade encerrou-se nesse momento.
A Igreja fundada por Cristo tem de ser uma Igreja apostólica. Ou seja, tem de possuir os poderes espirituais que Cristo confiou aos seus Apóstolos; tem de ensinar todas as verdades que os Apóstolos pregaram. Historicamente, só existe uma Igreja dotada de todas as credenciais necessárias para garantir-lhe a apostolicidade: a Igreja Católica.
Fonte: A Sabedoria do Cristão – TRESE, Leo – Editora Quadrante - São Paulo 1992
Nenhum comentário:
Postar um comentário